Paralelamente a essa multiplicidade de objetivos – antes complementares do que alternativos – emerge mais um traço que caracteriza a constituição histórica do PPG FEUSP: as diferentes vinculações disciplinares e a variedade de trajetórias profissionais e acadêmicas de seus/suas pesquisadores/as e estudantes que, não obstante suas peculiaridades, se irmanam na eleição de um interesse comum e compartilhado: a pesquisa acerca dos processos educativos – sejam eles formais ou informais –; de seus/suas agentes, princípios, objetivos e das práticas discursivas e não-discursivas que os caracterizam. Assim, as pesquisas realizadas no PGP da FEUSP têm, ao longo dessas cinco décadas, se voltado para a investigação de fenômenos educativos a partir de suas mais diferentes dimensões, sejam elas de natureza histórica, sociológica, filosófica, psicológica, linguística, artística, política, administrativa ou didático-pedagógica. Nelas têm sido abordadas questões relacionadas tanto aos sujeitos (individuais e coletivos) envolvidos no processo educativo como às estruturas e dinâmicas sociais em que se inserem; tanto os campos de discursividades acadêmicas e políticas quanto o complexo conjunto de práticas discursivas e não-discursivas que os caracterizam.

Essa diversidade de objetos, campos e perspectivas de investigação sofreu uma ampliação bastante significativa nas últimas décadas em função de transformações sociais – como o desenvolvimento de novas linguagens e aparatos de comunicação – e da emergência de novos campos de pesquisa, como a história e a sociologia da infância e juventude, a cultura dos povos afro-brasileiros, as questões de gênero ou àquelas vinculadas à educação de pessoas com deficiência, dentre outros. Assim, o PPG da FEUSP se nutre de seu legado histórico, mas o renova em função dos problemas e desafios do presente. Isso tanto em relação aos campos temáticos sobre os quais volta sua atenção como em relação à sua estrutura interna de funcionamento.

Por meio dessa nova configuração foi possível aliar a diversidade de perspectivas teóricas e áreas de estudo com a necessária articulação institucional, contemplando ainda a incorporação formal de novas frentes investigativas e garantindo a continuidade de abordagens já consolidadas.

Decorridos quatro anos dessa iniciativa, a CPG do PPG da FEUSP, em cooperação com as seis áreas de pesquisa, delineou um amplo programa institucional e comum de investigações intitulado Processos de subjetivação, dinâmicas sociais, práticas educativas e suas discursividades: um programa de pesquisas em educação. Trata-se de um documento propositivo visando a criação de propostas institucionais de investigação que, a partir de diferentes matrizes teóricas e perspectivas metodológicas, focalizem os fenômenos educacionais a partir de quatro grandes eixos que comportam amplas zonas de intersecção: 1. os/as agentes (individuais ou coletivos) que se constituem simultaneamente como sujeitos e objetos do processo educativo; 2, as estruturas e dinâmicas sociais em que tais processos formativos se inserem em cada contexto sócio-histórico; 3. o legado – sempre cambiante e sujeito a inovações – de práticas pedagógicas e educativas e 4. os campos de discursividade acadêmica, social e política por meio dos quais esses processos são compreendidos, justificados, normatizados, institucionalizados e transformados.

Assim, o PPG FEUSP assume como compromisso institucional uma dupla tarefa: a produção de conhecimentos públicos (reificados em livros, artigos; em materiais, técnicas etc., desenvolvidos por seus pesquisadores) e a formação de pesquisadores/as, professores/as e gestores/as – em suma, de intelectuais públicos/as – que atuam em todos os níveis do sistema de ensino, de sua gestão e de seu aperfeiçoamento, sem entre estes diferentes âmbitos estabelecer qualquer hierarquia arbitrária. A assunção de um compromisso dessa natureza implica, a nosso ver, um parâmetro avaliativo misto, pois exige tanto a consideração de dados acerca de sua produção intelectual quanto a estimativa do impacto social e político da presença de seus/suas egressos/as na cena educacional e política nacional, o que dificilmente poderia ser captado por qualquer sorte de mensuração fundada em uma métrica padronizada.

O PPG da FEUSP, como já ressaltado, acolhe um número significativo de estudantes que exercem o magistério nas redes básicas de educação ou em cargos e profissões a ela vinculados. Trata-se de um grupo de profissionais experientes que procuram aprofundar seus conhecimentos e refletir sobre problemas que, muitas vezes, emergem de sua prática cotidiana. Torna-se necessário, pois, um esforço acadêmico no sentido de fornecer a esses profissionais ferramentas teóricas e práticas para a transformação desse saber que acumularam na experiência – sempre contingente e local – em conhecimento público compartilhável, cuja enunciação almeja um grau de validade intersubjetivo. Assim, o PPG da FE SP se propõe a criar um ambiente acadêmico que acolha os/as professores/as na qualidade de intelectuais que têm em seu ofício – e nas condições sociais em que é produzido – um objeto de reflexão, questionamento e produção de conhecimentos inovadores. 

Aliado a esse acolhimento de profissionais da educação – sobretudo das redes públicas de ensino – o PPG da FEUSP adota, desde 2019, um sistema de reserva de vagas para candidatos/as autodeclarados/as negros/as, indígenas, pessoas com deficiência. Para o processo seletivo de 2021, são reservadas vagas também para pessoas trans. Trata-se de uma iniciativa cuja motivação incorpora, mas ultrapassa o compromisso com uma concepção de justiça social distributiva. Sua implementação tem uma justificativa também de natureza acadêmica: criar as condições de possibilidade para que certas modalidades de experiência simbólicas – até hoje pouco presentes na vida e na pesquisa acadêmica – possam vir a integrar o leque de problemas e perspectivas para os quais as pesquisas em educação se voltam. Trata-se, pois, de enriquecer o debate acadêmico abrindo-o para a diversidade de pontos de vista e de experiências existenciais, o que tende a aproximá-lo da concretude das condições sociais nas quais os processos educacionais efetivamente se realizam.

Paralelamente à solidificação do sistema de reserva de vagas, o PPG da FEUSP operou uma reestruturação do exame de proficiência de línguas, cujo modelo até então vigente resultava numa indesejável seletividade socioeconômica, aparentemente despojada de qualquer correspondência com uma suposta excelência acadêmica. Outra iniciativa que merece destaque foi a criação de cursos de extensão voltados para a preparação de projetos de pesquisa em ciências humanas. Trata-se de uma medida de relevância, a um só tempo, social e acadêmica. Seu objetivo é auxiliar potenciais candidatos/as a programas de pós-graduação a aumentar seu domínio da linguagem, dos procedimentos e recursos necessários à elaboração de projetos de pesquisas inovadores. Esses cursos contam com um sistema que aplica os critérios estabelecidos pela Câmara de Equidade Pós-Graduação da FEUSP para a prioridade de vagas. Outra iniciativa no mesmo sentido – já implantada no segundo semestre de 2020 – é a inclusão de critérios relacionados à raça/cor, identidade de gênero, situação de deficiência, condição socioeconômica, nas chamadas para bolsas e auxílios financeiros destinados à participação em congressos e eventos acadêmicos; à revisão, tradução e edição de capítulos e artigos; a viagens acadêmicas etc. Com medidas como essas, O PPG da FEUSP caminha no sentido de aliar excelência acadêmica e responsabilidade política, de forma a cooperar para que a presença de novos segmentos sociais no campo das pesquisas em educação amplie e enriqueça a produção de conhecimentos, incorporando pesquisadores/as oriundos/as de segmentos da população até agora alijados/as da vida e da produção acadêmica.